Do Quilombo à Universidade
Programas de assistência estudantil da UFCG garantem permanência de estudantes no Ensino Superior
William Oliveira Santos (foto), 25 anos, possui licenciatura em Física pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e atualmente é aluno do mestrado em Física da instituição. Isaías do Nascimento Silva, 20 anos, aluno do curso de Ciência da Computação da UFCG. O que a história dos dois têm em comum? Ambos são provenientes de escolas públicas, remanescentes de quilombolas e os primeiros membros de suas famílias a entrarem no Ensino Superior.
William é morador da Comunidade Quilombola Serra do Abreu, que fica entre as cidades de Nova Palmeira e Picuí - PB, onde vivem os seus pais e irmão. Terminou o curso de licenciatura em Física, em Cuité, e já emendou com o mestrado, em Campina Grande. Já Isaías é proveniente da Comunidade remanescente do Quilombo Caiana dos Crioulos, localizado na zona rural de Alagoa Grande, PB. Faz parte de uma família com 12 irmãos, nove deles foram embora para trabalhar no Rio de Janeiro, outros dois menores de idade moram no Quilombo com os pais. A curiosidade em saber como funcionava um computador despertou o interesse pelo curso de Ciência da Computação e as aulas de Física que o professor Rafael Rodrigues, do Centro de Educação e Saúde (CES),campus de Cuité da UFCG, ministrava na comunidade o incentivaram a tentar uma vaga na universidade.
Desde 2013, o professor Rafael frequenta a comunidade dando aulas de reforço para os alunos e conta com o apoio voluntário de outros professores da região que ministram aulas de redação e Matemática. Uma vez por semana, ele vai ao Quilombo para preparar os alunos para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).”O professor sempre está lá na comunidade nos incentivando, nos estimulando”, conta Isaías.
Além dele, outros estudantes do Quilombo também ingressaram na UFCG. Felipe de Oliveira no curso de Física, do campus de Cuité, e Maria Vitória Silva no curso de Engenharia de Biotecnologia e Bioprocessos, do campus de Sumé. “É muito bom saber que o pouco que a gente faz tem alguma contribuição. Nessa comunidades existem muitos alunos com potencial, que acabam indo trabalhar no Sudeste do país por falta de oportunidade. Então, a gente está sempre lá mostrando que existem outros caminhos”, ressalta Rafael.
Em 2017, o projeto “Aspectos matemáticos na Física do Ensino Médio do Curimataú paraibano” foi aprovado pelo Programa de Bolsas de Extensão (Probex) e contou com a participação do então estudante de licenciatura em Física, William de Oliveira. “A gente divulgava a Olimpíada de Física, realizava os experimentos nas escolas e também fomos ao quilombo para divulgar as bolsas”, explica.
E por falar em bolsas, os estudantes são unânimes em afirmar que se não fossem os programas de assistência estudantil, eles não teriam condições de permanecer na universidade. O Governo Federal, através do Programa Bolsa Permanência (PBP), concede um auxílio financeiro para indígenas e quilombolas visando minimizar as desigualdades sociais e contribuir para a permanência e a diplomação dos estudantes de graduação em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Atualmente, o valor é de R$ 900 para este grupo e 18 alunos da UFCG recebem a bolsa, paga diretamente pelo Ministério da Educação (MEC), com recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
Além desse benefício, a UFCG também conta com os programas de Residência Universitária e Restaurante Universitário, cujas seleções são realizadas semestralmente, e dos quais os dois são beneficiários - William contou com os benefícios na época da graduação. Atualmente, por conta do mestrado, ele é bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). E os programas podem ser acumuláveis com outras modalidades de bolsas acadêmicas, a exemplo de Programa de Educação Tutorial (PET), do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) ou Programa de Bolsas de Extensão (PROBEX).
“Os benefícios são importantes porque eu não teria condições de me manter aqui na cidade ou me deslocar. A comunidade também não tem acesso a internet. Ficaria difícil para eu realizar os trabalhos lá também”, explica Isaías. Opinião que é compartilhada por William. “Eu venho de uma família que é pobre. Na graduação, se não tivesse a bolsa não teria condições de ir para Cuité direito porque a minha cidade não disponibiliza o ônibus todo dia como as cidades circunvizinhas. Então, ia ficar difícil porque não teria como eu me manter na cidade, mesmo sendo uma cidade pequena que o custo de vida seja mais barato. Não teria como”, diz.
Exemplo
Após o ingresso na universidade, os estudantes afirmam que despertaram o interesse de outros membros em entrar no Ensino Superior. “Sempre que vou no quilombo eles perguntam como funciona”, relata Isaías. “Depois de mim, um primo meu se interessou e passou em Matemática, na UFCG, em Cuité. Meu irmão mais velho entrou, este ano, em Ciências da Religião, na UFPB, em João Pessoa ”, revela William.
Além de se tornarem exemplo para comunidade, os dois desejam realizar atividades no Quilombo. “Eu ainda não sei que área da computação seguir, mas quero realizar algum projeto no Quilombo quando terminar o curso”, fala Isaías. William já tem a ideia formatada em sua cabeça. “A perspectiva é dar aula de reforço em Matemática porque quando eu estagiei ainda na graduação em percebi que os alunos não têm dificuldades de entender os conceitos da Física. A deficiência se dá na parte Matemática. Quero dar reforço nas escolas, onde os alunos do quilombo estudam. Como eu pude vencer na vida também quero dar essa oportunidade para outras pessoas”, finaliza animado, ressaltando que após a graduação ele começou a compreender e exercer sua cidadania. “A minha graduação me abriu os horizontes, me deu oportunidades. Você começa a entender a vida e exercer a sua cidadania e isso só vem através de um bom estudo, de uma boa educação”, conclui.
(Ascom UFCG)
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